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segunda-feira, 5 de maio de 2025

Negócio entre colegas : Tarcisio vende fazenda de pesquisa á empresa de Paulo Skaf pela metade do valor de mercado

 


O governo de Tarcísio de Freitas, do Republicanos, vendeu parte de uma fazenda do estado de São Paulo usada para pesquisa científica ao agronegócio pela metade do valor de mercado – em um negócio cercado de acusações de descumprimento de leis e regras de transparência. E a gestão Tarcísio já deixou claro: outras terras da ciência vão ser vendidas.

Quem comprou o imóvel foi uma empresa do agronegócio chamada SFA Agro Empreendimentos e Participações, que tem como um dos sócios Paulo Skaf, empresário e político que se tornou colega de Tarcísio no Republicanos em 2022. Empresário influente, Skaf presidiu a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a Fiesp, entre 2004 e 2021 e articula sua volta ao cargo em 2026.

O processo de venda de parte da fazenda experimental, localizada em Pindamonhangaba, começou em 2017 e só foi concluído em julho de 2024. O negócio saiu apenas após uma batalha judicial e, diante da pouca publicidade e de indícios de ilegalidade, mobilizou políticos e entidades de pesquisa em busca de informações sobre a operação.

No fim das contas, o governo Tarcísio vendeu a terra por R$ 17,1 milhões. Mas, de acordo com dados da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo, a APqC, o valor médio de mercado do hectare em Pindamonhangaba oscila entre R$ 100 mil e R$ 130 mil, o que faria a área vendida valer entre R$ 35 milhões e R$ 45,5 milhões – ou seja, o estado de SP recebeu bem menos do que poderia.

A APqC também questiona o fato de não serem públicos o documento de vistoria e o laudo que avaliou o preço do terreno, além de pontuar que o governo Tarcísio descumpriu a Constituição Estadual e a lei 9475/96 ao não realizar audiência pública com a comunidade científica. Apesar das alegações, o Tribunal de Justiça de São Paulo, TJ-SP, validou a venda.

O terreno em questão tem 350 hectares – cerca de 300 campos de futebol – e fazia parte da Unidade Regional de Pesquisa e Desenvolvimento de Pindamonhangaba, imóvel de propriedade da Fazenda do Estado de São Paulo e atrelado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento, a SAA, desde 1938.

O governo de Tarcísio de Freitas, do Republicanos, vendeu parte de uma fazenda do estado de São Paulo usada para pesquisa científica ao agronegócio pela metade do valor de mercado – em um negócio cercado de acusações de descumprimento de leis e regras de transparência. E a gestão Tarcísio já deixou claro: outras terras da ciência vão ser vendidas.

Quem comprou o imóvel foi uma empresa do agronegócio chamada SFA Agro Empreendimentos e Participações, que tem como um dos sócios Paulo Skaf, empresário e político que se tornou colega de Tarcísio no Republicanos em 2022. Empresário influente, Skaf presidiu a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a Fiesp, entre 2004 e 2021 e articula sua volta ao cargo em 2026.

O processo de venda de parte da fazenda experimental, localizada em Pindamonhangaba, começou em 2017 e só foi concluído em julho de 2024. O negócio saiu apenas após uma batalha judicial e, diante da pouca publicidade e de indícios de ilegalidade, mobilizou políticos e entidades de pesquisa em busca de informações sobre a operação.

No fim das contas, o governo Tarcísio vendeu a terra por R$ 17,1 milhões. Mas, de acordo com dados da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo, a APqC, o valor médio de mercado do hectare em Pindamonhangaba oscila entre R$ 100 mil e R$ 130 mil, o que faria a área vendida valer entre R$ 35 milhões e R$ 45,5 milhões – ou seja, o estado de SP recebeu bem menos do que poderia.

A APqC também questiona o fato de não serem públicos o documento de vistoria e o laudo que avaliou o preço do terreno, além de pontuar que o governo Tarcísio descumpriu a Constituição Estadual e a lei 9475/96 ao não realizar audiência pública com a comunidade científica. Apesar das alegações, o Tribunal de Justiça de São Paulo, TJ-SP, validou a venda.

O terreno em questão tem 350 hectares – cerca de 300 campos de futebol – e fazia parte da Unidade Regional de Pesquisa e Desenvolvimento de Pindamonhangaba, imóvel de propriedade da Fazenda do Estado de São Paulo e atrelado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento, a SAA, desde 1938.


Fazenda vendida pelo governo Tarcísio à empresa de Skaf fica em Pindamonhangaba (Foto: APqC/Divulgação)

Ele é parte de uma fazenda que soma um total de 1.150 hectares e fica em uma zona de proteção ambiental. O espaço é usado para pesquisas de bovinocultura de leite e de corte, aquacultura com piscicultura, melhoramento genético de arroz e estudos sobre agroecologia, plantas alimentícias e medicinais. 

A unidade mantém convênio com a Cooperativa de Laticínios do Médio Vale do Paraíba, a Comevap, que agrega mais de 600 pequenos produtores e atende 20 municípios.

Após lei aprovada em dezembro de 2016 que autorizou a alienação de diversos imóveis do estado, a porção de terra da fazenda foi colocada à venda no ano seguinte, mas não houve interessados. O governador de São Paulo naquele ano era Geraldo Alckmin, então do PSDB.

Na época, a APqC, que monitora 39 áreas de experimentação ligadas à SAA, ajuizou uma ação civil pública e impetrou um mandado de segurança opondo-se à licitação para venda de parte da área. A alegação era que, além de servir a pesquisas e ser de interesse público, o local abriga as nascentes de água da propriedade. A medida judicial foi rejeitada e encerrada em 2022, afastando compradores por alguns anos.

Mas, em abril de 2024, a associação recebeu a informação de que o terreno fora vendido à empresa SFA Agro, de Paulo Skaf, seu filho Gabriel Junqueira Pamplona Skaf e mais dois empresários da região: o pecuarista Carlos Eduardo Pedrosa Auricchio e o cirurgião vascular e pecuarista Rubens Freire Gonçalves.

Além deles, completam a sociedade da SFA Agro, que foi registrada em cartório no dia 11 de agosto de 2022, quatro empresas de incorporação e urbanização relacionadas aos proprietários. As principais atividades da companhia são criação de gado, conservação de florestas e compra e venda de imóveis.

Passeio a cavalo dos novos donos alertou funcionários

Egresso do ramo têxtil, Paulo Skaf tem propriedades e negócios em Pindamonhangaba. Mas sua atuação vai muito além disso. Skaf é um empresário que atua em vários segmentos, como imóveis, construção, urbanização, seguros e agro. Mais do que um homem de negócios, ele ganhou projeção pelo envolvimento com a política.

De 2004 a 2021, Skaf presidiu a Fiesp — e também esteve no comando de instituições como Sesi, Senai, Sebrae e Centro das Indústrias do Estado, o Ciesp. Nestes 17 anos, o empresário concorreu três vezes a governador de São Paulo: em 2010, pelo PSB, e em 2014 e 2018, pelo MDB — perdeu nas três tentativas. Na última campanha que disputou, Skaf declarou um patrimônio de R$ 23,8 milhões.

Além das disputas eleitorais, o empresário ficou conhecido pela campanha “Não vou pagar o pato”, da Fiesp, contra o aumento de impostos e contra a volta da CPMF. Uma das ações da iniciativa foi a colocação de um pato amarelo gigante em frente à sede da federação, na Avenida Paulista. Nos meses seguintes, o pato amarelo acabou sendo muito explorado durante a batalha política que resultou no impeachment da presidente Dilma Rousseff, do PT, em 2016.

Gabriel Skaf, seu filho, é sócio de Skaf em diversas empresas. Dono da AB Areias, uma das maiores mineradoras de agregados para a construção civil do estado, como areia e brita, Carlos Auricchio atuou como conselheiro e vice-presidente da Fiesp entre 2011 e 2021, substituindo Skaf em sessões da federação. Proprietário de imóveis e negócios na região, Rubens Freire Gonçalves é dono da Fazenda Bela Vista, situada no km 94 da Rodovia Presidente Dutra e vizinha de cerca da área adquirida. 

Para surpresa dos funcionários do centro de pesquisa, o grupo de quatro empresários foi visto na propriedade, montado a cavalo. Uma foto desta visita teria sido tirada em abril de 2024, segundo pedido feito em dezembro passado pela deputada estadual Beth Sahão, do PT de São Paulo, para que a Procuradoria-Geral de Justiça do Estado investigue a venda – a imagem consta na solicitação feita pela parlamentar.

Pedido feito pela deputada estadual Beth Sahão, do PT de SP, inclui foto do que seria uma visi
ta dos sócios da SFA Agro à área, em abril de 2024 (Foto: Reprodução)

“Não entraram pela porta principal e foram direto para o local Brasília [a área vendida]. Entraram com caminhão, cavalos, e foram ver as divisas. Os seguranças e campeiros foram acionados, pois pensamos se tratar de roubo de gado”, relatou à reportagem um trabalhador da fazenda, que não quis se identificar por medo de represálias.

Intercept Brasil tentou contatar a SFA Agro e outras empresas de Skaf, por e-mail e telefone, para perguntar sobre as circunstâncias e o valor do negócio envolvendo a fazenda em Pindamonhangaba. Não houve retorno até a publicação desta reportagem.

Em nota enviada após a reportagem ter sido publicada, a assessoria de Paulo Skaf confirmou que a compra da fazenda foi efetivada em 2024 a partir de “oferta por meio público, de acordo com as regras definidas pelo Fundo de Investimentos Imobiliários do Estado de São Paulo”.

O texto cita que “a oferta da SFA [Agro] foi certamente a mais alta, com pagamento à vista” e, “por isso, foi a vencedora”. A assessoria de Skaf ainda pontuou que “a fazenda é utilizada para fins lucrativos” e que cabe ao fundo imobiliário do estado de São Paulo explicar sobre as “questões ligadas ao regramento do vendedor”.

Ao buscar informações sobre a venda de parte da fazenda, um ponto que chamou atenção da APqC foi que o documento de realização de vistoria e o laudo imobiliário do imóvel – que mede o valor atual do bem – não são públicos. 

A associação ainda pontua que não houve uma audiência pública com a comunidade científica, necessária para a alienação de áreas de pesquisas, conforme estipula a Constituição Estadual e a lei 9475/96

Também destaca que uma audiência realizada durante a primeira tentativa de venda, em 2017, não deveria ter sido validada. Entre os argumentos para isso, estão a marcação da reunião apenas um dia antes da realização e a falta de quórum suficiente. A APqC também questionou as reais motivações do estado para a venda da área.

Venda abaixo do valor de mercado

A fazenda em Pindamonhangaba faz parte da Agência Paulista de Tecnologia de Agronegócios, a APTA, cujas unidades regionais compreendem a maior rede irradiadora de pesquisa, ciência e tecnologia agrícola de São Paulo. Situada na Zona de Proteção Ambiental e Desenvolvimento Estratégico, a área vendida estava sendo usada para pesquisas de gado de corte, reprodução animal e rizicultura.

Localizado no km 97 da Rodovia Presidente Dutra, o imóvel foi cercado e agora é ocupado para criação de gado pela SFA Agro. Uma balança recém-adquirida ficou retida após a compra do imóvel, segundo a APqC. “Há um procedimento para a desocupação do espaço. Os empresários compraram a área, não os bens que foram adquiridos por meio de projetos de pesquisa”, explica Helena Dutra Lutgens, presidente da associação.

Em 2017, o terreno da fazenda que acabou vendido foi avaliado em R$ 10,5 milhões pelo governo de São Paulo. Corrigido pelo IGP-M, o valor seria de cerca de R$ 18,5 milhões em julho de 2024, mês em que o negócio foi firmado com a SFA Agro. Entretanto, a matrícula de compra e venda, ao qual o Intercept teve acesso, confirma que a empresa do agro pagou R$ 17,1 milhões pelos 350 hectares de área.

A título de comparação, a Unidade de Pesquisa em Agricultura Ecológica, em São Roque, com pouco mais de 43 hectares, teve neste ano seu valor médio estimado pela Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo, Itesp, em R$ 107,4 milhões. 

“São Roque está sendo avaliada como área urbana, mas Pindamonhangaba, mesmo como área rural, foi subavaliada”, explica o pesquisador Joaquim Adelino Filho, que foi presidente da APqC em 2017. “Na época, a avaliação foi muito superficial, com base em valor venal. Os critérios de avaliação atuais são mais detalhados”, pontua.

Pedidos em série diante da falta de transparência

A falta de clareza sobre os detalhes da venda da fazenda em Pindamonhangaba mobilizou a Câmara Municipal de Vereadores, que enviou, logo após a visita dos empresários à fazenda, um pedido de informações ao governo Tarcísio. Foram solicitadas cópias do processo administrativo, da legislação vigente e da documentação das empresas envolvidas, incluindo intermediários. O pedido foi feito há um ano, mas a Câmara não teve resposta.

Em agosto de 2024, o deputado estadual Carlos Giannazi, do PSOL de São Paulo, enviou requerimento similar à SAA do governo Tarcísio. Quatro meses depois, em dezembro, foi a vez da deputada estadual Beth Sahão, do PT de SP, pedir uma investigação à Procuradoria-Geral de Justiça do Estado – a parlamentar disse que não teve retorno da PGJ.

Em resposta ao requerimento de Giannazi, a SAA declarou que “foi adotada uma política pelo Governo do Estado de São Paulo para alienação de imóveis que estão sendo subutilizados, para otimização dos recursos públicos, em prol da sociedade”. Também pontuou que o governo está “em fase de levantamento e estudos, para averiguar quais imóveis estão sendo subutilizados para uma possível alienação”. 

O texto ainda destacou que, antes da alienação, ainda seria necessário  “análise do Conselho do Patrimônio Imobiliário, audiência com a Comunidade Científica, conforme prevê a lei, e autorização do Governador do Estado”.

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O Fundo de Investimento Imobiliário do Estado de São Paulo, o FIISP, passou a ser adotado para a venda de imóveis a partir da gestão de João Doria, em 2019. Na época, o governo firmou um contrato com a corretora Singulare para administrar o fundo por cinco anos — mas este acordo foi prorrogado, em 2024, por tempo indeterminado.

Conforme o regulamento do fundo, disponível no site da corretora Singulare, a publicidade das transações deve ser feita na página do administrador na internet, em local de destaque, além de ser mantida disponível para os cotistas. 

Entretanto, o Intercept constatou que alguns links da página da Singulare não funcionam perfeitamente, como os de informes mensais, demonstrações financeiras e atas de assembleias. No dia 23 de abril, por exemplo, tentamos acessar o informe mensal sobre o FIISP, mas o link não funcionou.

De acordo com os poucos dados disponíveis na página do FIISP, o terreno da fazenda de Pindamonhangaba recebeu quatro propostas de compra entre 13 e 27 de março de 2024 – os valores, entretanto, não são públicos. Uma das propostas foi da Comevap, interessada em adquirir o terreno para poder ampliar seu espaço de pesquisa e plantio. “O governo havia prometido uma área maior para nós”, diz Aristeu Trannin, diretor da cooperativa.

Consultada pelo Intercept sobre a venda, a Singulare apenas afirmou que “o imóvel do fundo foi alienado de acordo com as normas jurídicas e regulatórias vigentes e de acordo com o edital que constitui o fundo proprietário”. 

Apesar de solicitarmos mais de uma vez o laudo de avaliação do imóvel e as propostas de compra recebidas, a corretora não compartilhou os documentos com a reportagem. “Se eles seguiram as normas, deveriam disponibilizar”, afirma a advogada Helena Goldman, assessora jurídica da APqC.

“Fundo pode ser legal, mas é imoral. Não há transparência. Leis são criadas para salvaguardar interesses escusos e garantir a entrega de patrimônio público”, critica Helena Dutra Lutgens, presidente da associação.

Batalha judicial adiou, mas não evitou a venda

A advogada Helena Goldman, da APqC, pontua que, na negociação para a venda da área em Pindamonhangaba em 2024, não foi necessário um edital de licitação pública, como na primeira tentativa de venda, em 2017, porque o terreno foi integrado ao FIISP. “De forma simples, a maior diferença entre os dois sistemas é a transparência e publicidade”, explica.

“Inicialmente, a gente nem sabia que o imóvel havia sido integralizado pelo fundo. Soubemos apenas quando o Skaf foi conhecer a área que adquiriu”, afirma Goldman. “Mas continua sendo uma área de pesquisa e de interesse público. Faltou uma audiência adequada. Centros de pesquisa estão protegidos primeiramente pelo artigo 272 da Constituição Estadual, que determina que esses locais não podem ser alienados e transferidos sem audiência com a comunidade científica e aprovação do Poder Legislativo”, aponta ela.

Goldman também considera que o laudo de avaliação imobiliária deveria ter sido atualizado antes da venda. “O regulamento diz que, para integralizar o imóvel no fundo, é necessária a avaliação dos ativos imobiliários, indicando a metodologia utilizada, a localização, a vocação de uso, o estado de conservação das benfeitorias, as informações sobre eventual ocupação de terceiros ou pendências de regularização imobiliária”.Fazenda vendida pelo governo Tarcísio à empresa de Skaf fica em Pindamonhangaba (Foto: APqC/Divulgação)

Ele é parte de uma fazenda que soma um total de 1.150 hectares e fica em uma zona de proteção ambiental. O espaço é usado para pesquisas de bovinocultura de leite e de corte, aquacultura com piscicultura, melhoramento genético de arroz e estudos sobre agroecologia, plantas alimentícias e medicinais. 

A unidade mantém convênio com a Cooperativa de Laticínios do Médio Vale do Paraíba, a Comevap, que agrega mais de 600 pequenos produtores e atende 20 municípios.

Após lei aprovada em dezembro de 2016 que autorizou a alienação de diversos imóveis do estado, a porção de terra da fazenda foi colocada à venda no ano seguinte, mas não houve interessados. O governador de São Paulo naquele ano era Geraldo Alckmin, então do PSDB.

Na época, a APqC, que monitora 39 áreas de experimentação ligadas à SAA, ajuizou uma ação civil pública e impetrou um mandado de segurança opondo-se à licitação para venda de parte da área. A alegação era que, além de servir a pesquisas e ser de interesse público, o local abriga as nascentes de água da propriedade. A medida judicial foi rejeitada e encerrada em 2022, afastando compradores por alguns anos.

Mas, em abril de 2024, a associação recebeu a informação de que o terreno fora vendido à empresa SFA Agro, de Paulo Skaf, seu filho Gabriel Junqueira Pamplona Skaf e mais dois empresários da região: o pecuarista Carlos Eduardo Pedrosa Auricchio e o cirurgião vascular e pecuarista Rubens Freire Gonçalves.

Além deles, completam a sociedade da SFA Agro, que foi registrada em cartório no dia 11 de agosto de 2022, quatro empresas de incorporação e urbanização relacionadas aos proprietários. As principais atividades da companhia são criação de gado, conservação de florestas e compra e venda de imóveis.

Passeio a cavalo dos novos donos alertou funcionários

Egresso do ramo têxtil, Paulo Skaf tem propriedades e negócios em Pindamonhangaba. Mas sua atuação vai muito além disso. Skaf é um empresário que atua em vários segmentos, como imóveis, construção, urbanização, seguros e agro. Mais do que um homem de negócios, ele ganhou projeção pelo envolvimento com a política.

De 2004 a 2021, Skaf presidiu a Fiesp — e também esteve no comando de instituições como Sesi, Senai, Sebrae e Centro das Indústrias do Estado, o Ciesp. Nestes 17 anos, o empresário concorreu três vezes a governador de São Paulo: em 2010, pelo PSB, e em 2014 e 2018, pelo MDB — perdeu nas três tentativas. Na última campanha que disputou, Skaf declarou um patrimônio de R$ 23,8 milhões.

Além das disputas eleitorais, o empresário ficou conhecido pela campanha “Não vou pagar o pato”, da Fiesp, contra o aumento de impostos e contra a volta da CPMF. Uma das ações da iniciativa foi a colocação de um pato amarelo gigante em frente à sede da federação, na Avenida Paulista. Nos meses seguintes, o pato amarelo acabou sendo muito explorado durante a batalha política que resultou no impeachment da presidente Dilma Rousseff, do PT, em 2016.

Gabriel Skaf, seu filho, é sócio de Skaf em diversas empresas. Dono da AB Areias, uma das maiores mineradoras de agregados para a construção civil do estado, como areia e brita, Carlos Auricchio atuou como conselheiro e vice-presidente da Fiesp entre 2011 e 2021, substituindo Skaf em sessões da federação. Proprietário de imóveis e negócios na região, Rubens Freire Gonçalves é dono da Fazenda Bela Vista, situada no km 94 da Rodovia Presidente Dutra e vizinha de cerca da área adquirida. 

Para surpresa dos funcionários do centro de pesquisa, o grupo de quatro empresários foi visto na propriedade, montado a cavalo. Uma foto desta visita teria sido tirada em abril de 2024, segundo pedido feito em dezembro passado pela deputada estadual Beth Sahão, do PT de São Paulo, para que a Procuradoria-Geral de Justiça do Estado investigue a venda – a imagem consta na solicitação feita pela parlamentar.

Pedido feito pela deputada estadual Beth Sahão, do PT de SP, inclui foto do que seria uma visita dos sócios da SFA Agro à área, em abril de 2024 (Foto: Reprodução)Pedido feito pela deputada estadual Beth Sahão, do PT de SP, inclui foto do que seria uma visita dos sócios da SFA Agro à área, em abril de 2024 (Foto: Reprodução)

“Não entraram pela porta principal e foram direto para o local Brasília [a área vendida]. Entraram com caminhão, cavalos, e foram ver as divisas. Os seguranças e campeiros foram acionados, pois pensamos se tratar de roubo de gado”, relatou à reportagem um trabalhador da fazenda, que não quis se identificar por medo de represálias.

Intercept Brasil tentou contatar a SFA Agro e outras empresas de Skaf, por e-mail e telefone, para perguntar sobre as circunstâncias e o valor do negócio envolvendo a fazenda em Pindamonhangaba. Não houve retorno até a publicação desta reportagem.

Em nota enviada após a reportagem ter sido publicada, a assessoria de Paulo Skaf confirmou que a compra da fazenda foi efetivada em 2024 a partir de “oferta por meio público, de acordo com as regras definidas pelo Fundo de Investimentos Imobiliários do Estado de São Paulo”.

O texto cita que “a oferta da SFA [Agro] foi certamente a mais alta, com pagamento à vista” e, “por isso, foi a vencedora”. A assessoria de Skaf ainda pontuou que “a fazenda é utilizada para fins lucrativos” e que cabe ao fundo imobiliário do estado de São Paulo explicar sobre as “questões ligadas ao regramento do vendedor”.

Ao buscar informações sobre a venda de parte da fazenda, um ponto que chamou atenção da APqC foi que o documento de realização de vistoria e o laudo imobiliário do imóvel – que mede o valor atual do bem – não são públicos. 

A associação ainda pontua que não houve uma audiência pública com a comunidade científica, necessária para a alienação de áreas de pesquisas, conforme estipula a Constituição Estadual e a lei 9475/96

Também destaca que uma audiência realizada durante a primeira tentativa de venda, em 2017, não deveria ter sido validada. Entre os argumentos para isso, estão a marcação da reunião apenas um dia antes da realização e a falta de quórum suficiente. A APqC também questionou as reais motivações do estado para a venda da área.

Venda abaixo do valor de mercado

A fazenda em Pindamonhangaba faz parte da Agência Paulista de Tecnologia de Agronegócios, a APTA, cujas unidades regionais compreendem a maior rede irradiadora de pesquisa, ciência e tecnologia agrícola de São Paulo. Situada na Zona de Proteção Ambiental e Desenvolvimento Estratégico, a área vendida estava sendo usada para pesquisas de gado de corte, reprodução animal e rizicultura.

Localizado no km 97 da Rodovia Presidente Dutra, o imóvel foi cercado e agora é ocupado para criação de gado pela SFA Agro. Uma balança recém-adquirida ficou retida após a compra do imóvel, segundo a APqC. “Há um procedimento para a desocupação do espaço. Os empresários compraram a área, não os bens que foram adquiridos por meio de projetos de pesquisa”, explica Helena Dutra Lutgens, presidente da associação.

Em 2017, o terreno da fazenda que acabou vendido foi avaliado em R$ 10,5 milhões pelo governo de São Paulo. Corrigido pelo IGP-M, o valor seria de cerca de R$ 18,5 milhões em julho de 2024, mês em que o negócio foi firmado com a SFA Agro. Entretanto, a matrícula de compra e venda, ao qual o Intercept teve acesso, confirma que a empresa do agro pagou R$ 17,1 milhões pelos 350 hectares de área.

A título de comparação, a Unidade de Pesquisa em Agricultura Ecológica, em São Roque, com pouco mais de 43 hectares, teve neste ano seu valor médio estimado pela Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo, Itesp, em R$ 107,4 milhões. 

“São Roque está sendo avaliada como área urbana, mas Pindamonhangaba, mesmo como área rural, foi subavaliada”, explica o pesquisador Joaquim Adelino Filho, que foi presidente da APqC em 2017. “Na época, a avaliação foi muito superficial, com base em valor venal. Os critérios de avaliação atuais são mais detalhados”, pontua.

Pedidos em série diante da falta de transparência

A falta de clareza sobre os detalhes da venda da fazenda em Pindamonhangaba mobilizou a Câmara Municipal de Vereadores, que enviou, logo após a visita dos empresários à fazenda, um pedido de informações ao governo Tarcísio. Foram solicitadas cópias do processo administrativo, da legislação vigente e da documentação das empresas envolvidas, incluindo intermediários. O pedido foi feito há um ano, mas a Câmara não teve resposta.

Em agosto de 2024, o deputado estadual Carlos Giannazi, do PSOL de São Paulo, enviou requerimento similar à SAA do governo Tarcísio. Quatro meses depois, em dezembro, foi a vez da deputada estadual Beth Sahão, do PT de SP, pedir uma investigação à Procuradoria-Geral de Justiça do Estado – a parlamentar disse que não teve retorno da PGJ.

Em resposta ao requerimento de Giannazi, a SAA declarou que “foi adotada uma política pelo Governo do Estado de São Paulo para alienação de imóveis que estão sendo subutilizados, para otimização dos recursos públicos, em prol da sociedade”. Também pontuou que o governo está “em fase de levantamento e estudos, para averiguar quais imóveis estão sendo subutilizados para uma possível alienação”. 

O texto ainda destacou que, antes da alienação, ainda seria necessário  “análise do Conselho do Patrimônio Imobiliário, audiência com a Comunidade Científica, conforme prevê a lei, e autorização do Governador do Estado”.

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O Fundo de Investimento Imobiliário do Estado de São Paulo, o FIISP, passou a ser adotado para a venda de imóveis a partir da gestão de João Doria, em 2019. Na época, o governo firmou um contrato com a corretora Singulare para administrar o fundo por cinco anos — mas este acordo foi prorrogado, em 2024, por tempo indeterminado.

Conforme o regulamento do fundo, disponível no site da corretora Singulare, a publicidade das transações deve ser feita na página do administrador na internet, em local de destaque, além de ser mantida disponível para os cotistas. 

Entretanto, o Intercept constatou que alguns links da página da Singulare não funcionam perfeitamente, como os de informes mensais, demonstrações financeiras e atas de assembleias. No dia 23 de abril, por exemplo, tentamos acessar o informe mensal sobre o FIISP, mas o link não funcionou.

De acordo com os poucos dados disponíveis na página do FIISP, o terreno da fazenda de Pindamonhangaba recebeu quatro propostas de compra entre 13 e 27 de março de 2024 – os valores, entretanto, não são públicos. Uma das propostas foi da Comevap, interessada em adquirir o terreno para poder ampliar seu espaço de pesquisa e plantio. “O governo havia prometido uma área maior para nós”, diz Aristeu Trannin, diretor da cooperativa.

Consultada pelo Intercept sobre a venda, a Singulare apenas afirmou que “o imóvel do fundo foi alienado de acordo com as normas jurídicas e regulatórias vigentes e de acordo com o edital que constitui o fundo proprietário”. 

Apesar de solicitarmos mais de uma vez o laudo de avaliação do imóvel e as propostas de compra recebidas, a corretora não compartilhou os documentos com a reportagem. “Se eles seguiram as normas, deveriam disponibilizar”, afirma a advogada Helena Goldman, assessora jurídica da APqC.

“Fundo pode ser legal, mas é imoral. Não há transparência. Leis são criadas para salvaguardar interesses escusos e garantir a entrega de patrimônio público”, critica Helena Dutra Lutgens, presidente da associação.

Batalha judicial adiou, mas não evitou a venda

A advogada Helena Goldman, da APqC, pontua que, na negociação para a venda da área em Pindamonhangaba em 2024, não foi necessário um edital de licitação pública, como na primeira tentativa de venda, em 2017, porque o terreno foi integrado ao FIISP. “De forma simples, a maior diferença entre os dois sistemas é a transparência e publicidade”, explica.

“Inicialmente, a gente nem sabia que o imóvel havia sido integralizado pelo fundo. Soubemos apenas quando o Skaf foi conhecer a área que adquiriu”, afirma Goldman. “Mas continua sendo uma área de pesquisa e de interesse público. Faltou uma audiência adequada. Centros de pesquisa estão protegidos primeiramente pelo artigo 272 da Constituição Estadual, que determina que esses locais não podem ser alienados e transferidos sem audiência com a comunidade científica e aprovação do Poder Legislativo”, aponta ela.

Goldman também considera que o laudo de avaliação imobiliária deveria ter sido atualizado antes da venda. “O regulamento diz que, para integralizar o imóvel no fundo, é necessária a avaliação dos ativos imobiliários, indicando a metodologia utilizada, a localização, a vocação de uso, o estado de conservação das benfeitorias, as informações sobre eventual ocupação de terceiros ou pendências de regularização imobiliária”.

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